Recentemente foi publicado o resultado do ENEM por escola. Com a atual mania de serem criadas classificações (1.000 lugares para ver antes de morrer, as 100 melhores universidades no mundo ou, pior, os 1.000 melhores pesquisadores da América Latina) logo saíram listas e análises nos meios de divulgação sobre as melhores escolas, todas baseadas neste indicador único! Logo após, o Ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro, deu uma entrevista para a Folha de São Paulo salientando alguns aspectos importantes.
Folha: Voltando aos resultados do Enem, que sugestão o sr. daria para famílias que estão escolhendo escolas?
Ministro: Depende de várias coisas. Se tem dinheiro para mensalidade ou se vai para a escola pública. Escolha uma escola perto de casa, que não estresse o aluno indo e voltando.
A nota do Enem é importante. Você pode identificar várias escolas da região, mas deve visitá-las. E, hoje, quando você olha na tabela do Enem, há diversos indicadores: se a escola atende classes sociais mais pobres, se tem permanência longa dos alunos e se é grande.
Tendo a dizer: procure uma escola maior. Ali, seu filho terá contato com pessoas mais diferentes entre si. Vai conhecer o preguiçoso, o esforçado, o desobediente, tipos de pessoas que ele encontrará na vida. Numa escola pequena, as pessoas podem ser muito parecidas. A nota pode ser maior, porque é mais fácil dar aula para estudantes parecidos. Mas, no futuro, o garoto ou a garota não vai conseguir lidar com um mundo cada vez mais complexo.
Folha: Esse convívio compensa a nota menor no Enem?
Ministro: Claro que, se a escola é ruim, tem de sair. Mas a partir de determinado patamar… A escola não é apenas aulas. Tem muito material na internet, a pessoa pode ler romances. É mais importante para a pessoa sentir que está se formando. Mais importante do que saber os afluentes das margens esquerda e direita do rio Amazonas é saber pensar.
Esta entrevista está mostrando claramente (há outras partes que tratam da disparidade socioeconômica) que a escolha e avaliação de uma escola ou curso são é apenas uma decisão baseada em um critério único, mas uma decisão complexa e adaptada à realidade do aluno. Com a atual crise no Brasil estou repensando algumas ideias antigas. Em dezembro de 2006 escrevi uma crônica com o título: “As Universidades brasileiras são competitivas?”. Se passaram quase nove anos e está na hora de rever alguns pontos de vista. Um trecho daquela crônica dizia:
“... Por outro lado há os cursos de “baixo custo” e “baixa tarifa”, como aquelas linhas aéreas que servem pacotinhos de amendoim em voos de quatro horas. O pior é que há pessoas que pensam que aquelas belas propagandas em outdoors de cursos de “baixa tarifa” são uma alternativa de trabalho profissional e e sonham com a ascensão social oferecida por estes diplomas. Bem, terão um lindo diploma, talvez colorido e dourado, para colocar na parede”.
O presuposto daquela crônica era que deveríamos ter Universidades de qualidade mundial. Naquela época pensávamos que o Brasil (ou Brazil) estava decolando e se tornando uma real potência mundial. Agora percebemos que somos mesmo um representante do Terceiro Mundo. Há algum tempo escrevi uma série de posts no blog sobre a qualidade dos cursos de pós-graduação:
- O que é um bom programa de pós-graduação?
- Doutorado em Computação (Stanford I – Escolha do grupo e do orientador)
- Doutorado em Computação (Stanford II – Os cursos)
- Doutorado em Computação (Stanford III – A seleção para o doutorado)
- Doutorado em Computação (Stanford IV – O exame de qualificação)
- Doutorado em Computação (Stanford V – A tese)
Eu pretendia fazer uma análise dos cursos de pós-graduação de primeira linha no mundo para que pudéssemos utilizá-los como modelos. Depois entendi a irrealidade de meu objetivo e desistí de continuar este estudo e publicação, leiam os posts acima e entenderão que é impossível para nós com as regulamentações bur(r)ocráticas e controles dos TCUs fazer qualquer coisa assemelhada. No último Congresso da SBC, em uma plenária do SECOMU, surgiu a discussão sobre a qualidade de nossos cursos. Esta discussão foi muito impactante para mim. Desde que entrei na Universidade houve uma mudança da noite para o dia. Naquela época éramos realmente periféricos e hoje nossos programas de pós-graduação de ponta têm uma boa visibilidade no mundo. O mesmo se passa com nossos bons cursos de graduação. Mas a pergunta que não quer calar é: “Teremos realmente Universidades de primeira linha?”.
O que é uma universidade de primeira linha? São Universidades com prêmios Nobel, são Universidades para onde os pesquisadores top querem ir em seus sabáticos, são Universidades para onde os melhores alunos do mundo querem ir para ter seu futuro assegurado. Não temos nenhum Prêmio Nobel no Brasil, agora nem mesmo futebol de primeira linha. Hoje, lendo o jornal, leio a classificação de Xangai ode aparecem a USP na 143ª posição, a UFMG na 317ª, a UFRJ na 318ª, a Estadual Paulista na 362ª, a UNICAMP na 365ª e a UFRGS na 421ª. No Face estamos recebendo várias mensagens informando sobre a não abertura do segundo semestre de Universidades Federais por falta de verbas. Tenho informação de que ocorrerão algumas dezenas de demissões de porofessores DE até o fim do ano em boas Universidades privadas por redução de alunos. Algo vai muito mal.
Então estou pensando que todos estes cursos de baixo custo são importantes para aumentar o nível médio de formação dos brasileiros. Algum dia esta melhoria de conhecimento e de formação vai estimular uma ação de mercado: as pessoas vão ter mais recursos e procurarão os cursos que ofereçam maiores possibilidades de futuro e de carreira. Acho que precisamos entender que somos um país pobre e que não há como termos realmente a competitividade de primeira linha. Alguns poucos grupos podem estar neste nível, mas nenhuma Universidade pode se comparar com as de primeira linha no mundo. Temos, isto sim, que garantir nossa posição na liderança da segunda divisão, mas mesmo isto estamos perdendo em relação aos BRICS. Para isto a Sociedade e o Governo precisam entender que precisamos ter algumas Universidades de primeira linha, nestas o acesso deveria ser exclusivamente pelo mérito acadêmico. Nestas Universidades deveria ser garantido o acesso e condição de estudo (bolsas, alojamento, apoio) a todos os que tivessem mérito e dedicação, independentemente de sua condição socioeconômica. Aliás, é isto que a China está fazendo. A ascensão social e a cultura geral só pode ser obtida por grandes investimentos em educação e pela existência de níveis de ensino adaptados a cada situação pessoal.