O momento da defesa de doutorado é o ápice de uma trajetória de pesquisa, e a banca avaliadora assume, nessa circunstância, um papel que exige distanciamento, escuta e precisão. O avaliador, diante da tese, precisa agir como um psiquiatra ao receber um novo paciente: antes de qualquer julgamento, suspende suas preferências teóricas, evita a tentação de comparar com seus próprios trabalhos e mantém-se aberto para compreender o projeto em seus próprios termos.
Tal como na clínica, o primeiro passo é um exame cuidadoso. Na pesquisa, isso significa analisar a coerência da proposta, a clareza das hipóteses, a consistência dos conceitos utilizados e a pertinência do método adotado. O “histórico” não está em prontuários, mas nas páginas dedicadas à fundamentação teórica, onde se encontram as influências intelectuais, as escolhas metodológicas e as referências que moldaram o trabalho. É nesse passado que se compreende o presente do texto e se vislumbra seu potencial futuro.
O avaliador, assim como o psiquiatra, também recorre a testes. No contexto acadêmico, esses testes são perguntas estratégicas, provocações intelectuais e contrapontos metodológicos. Permitem verificar a robustez das conclusões, explorar possíveis fragilidades e avaliar se as respostas dadas resistem a diferentes ângulos de análise. Essa etapa não busca desestabilizar o candidato, mas oferecer a oportunidade de demonstrar segurança conceitual, capacidade de síntese e domínio do campo de estudo.
Há também, no exercício de avaliação, uma dimensão ética. É preciso reconhecer que a defesa é, ao mesmo tempo, um rito acadêmico e um momento humano. O avaliador lida com anos de dedicação, noites de trabalho e expectativas legítimas. Por isso, a postura deve ser de respeito e de contribuição, mesmo quando há críticas substantivas a apresentar. Uma tese pode, e deve, ser aprimorada, mas a crítica que constrói é sempre mais valiosa do que a que somente destrói.
Ao final, a banca, como o médico que conclui seu diagnóstico, apresenta suas considerações. No caso acadêmico, essas considerações são recomendações, ajustes e perspectivas de pesquisa futura. Mais do que um veredito formal, representam um convite para o autor aprofundar e amplie seu pensamento. Porque a defesa de doutorado não é somente o encerramento de um ciclo, mas a abertura de um novo, em que o pesquisador leva consigo a maturidade intelectual que esse processo, conduzido com rigor e humanidade, consegue proporcionar.