Quando Discutir é Inútil

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Antes de se engajar em uma disputa verbal ou intelectual, é prudente perguntar a si se o interlocutor possui maturidade cognitiva e disposição emocional suficientes para compreender o conceito de perspectiva distinta. Essa pergunta, ainda que simples, contém implicações profundas. Discutir com alguém que não está preparado para considerar a possibilidade de estar equivocado ou de que outra visão pode ter validade é, do ponto de vista epistemológico, um exercício estéril. Em tais situações, o debate se converte em mero confronto de egos, e não em busca cooperativa da verdade.

Nem todo argumento merece o investimento de sua energia mental e emocional. Em particular, no âmbito das discussões sobre ciência e racionalidade, é frequente encontrar pessoas que, mesmo diante de explicações fundamentadas em dados, teorias consistentes e métodos rigorosos, permanecem impermeáveis à revisão de suas crenças. Isso se deve, em parte, à dissonância cognitiva e à resistência psicológica à mudança de paradigma, fenômenos amplamente documentados pela psicologia e pela filosofia da ciência.

Em muitos casos, o interlocutor não escuta para compreender, mas sim para reagir. Ele está preso a um quadro de referências fechado, recusa-se a aplicar os princípios básicos do pensamento crítico — como a abertura ao contraditório, a autocorreção e a análise lógica — e, por isso, qualquer tentativa de argumentação racional torna-se infrutífera. O resultado inevitável é o esgotamento do debatedor que, mesmo armado de boas razões, vê-se diante de uma barreira intransponível: a recusa deliberada de considerar o outro lado da questão.

Há uma diferença essencial entre uma discussão saudável, que pressupõe respeito mútuo e busca conjunta de esclarecimento, e um debate inútil, em que a intenção subjacente é apenas confirmar preconceitos ou derrotar simbolicamente o outro. A primeira forma é condizente com o ideal iluminista da ciência — baseada na crítica construtiva, na refutabilidade das ideias e na humildade epistemológica. A segunda, ao contrário, é típica de ambientes dogmáticos, em que a verdade é pré-definida e o diálogo é somente uma formalidade vazia.

Conversar com alguém que possui mente aberta, valoriza o desenvolvimento pessoal e reconhece que o conhecimento é sempre provisório e perfectível pode ser profundamente enriquecedor, mesmo quando não se chega a um acordo. O desacordo, quando bem conduzido, é motor do avanço intelectual. É nesse espaço que floresce a ciência: na tensão produtiva entre hipóteses concorrentes, na crítica mútua e no teste constante das ideias.

No entanto, tentar convencer uma pessoa que se recusa a olhar além das próprias convicções é como falar a uma parede. Por mais sólida que seja sua argumentação, ela será distorcida, deturpada ou simplesmente rejeitada — não porque carece de fundamento, mas porque ameaça a estrutura interna de crenças do outro, muitas vezes alicerçada em fatores emocionais, ideológicos ou identitários.

A maturidade intelectual não consiste em vencer debates, mas em saber quando um debate não tem valor epistêmico. É compreender que a paz interior e a integridade do pensamento crítico são mais importantes do que “provar” algo a alguém que, de antemão, decidiu não escutar. A ciência ensina que nem toda hipótese merece ser testada e que nem toda interação leva ao progresso do conhecimento. Analogamente, nem toda batalha dialética é necessária ou frutífera.

Nem todos merecem — ou estão preparados para — uma explicação fundamentada. Às vezes, a decisão mais racional é simplesmente se retirar, não por falta de argumentos, mas por reconhecer que a outra parte não está disposta a participar do jogo cooperativo da razão. E esse ônus, é importante ressaltar, não é seu. O diálogo, como a ciência, requer dois comprometidos com a verdade — e não somente um.

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