Para aqueles que como eu acreditam que é possível publicar artigos de alta qualidade em Português, apresento este texto retirado do livro Muito Além do Nosso Eu do neurocientista Miguel Nicolelis. Este pequeno trecho (p. 81-82) mostra que um dos fundadores da Neurociência, o Prof. Santiago Ramón y Cajal – prêmio Nobel de Medicina de 1906, obrigou aos famosos da época aprender Espanhol.
Nascido em Petilla de Aragón, Santiago Ramón y Cajal era um homem obsessivo e autocrático, um gênio teimoso que, sozinho, deu origem à verdadeira revolução que lançou a neurociência na agenda científica mundial. Tal feito baseou-se principalmente na demonstração de que o cérebro, como outros órgãos, é formado por uma enorme coleção de células.
Uma pequena anedota dá a dimensão dos obstáculos que Cajal teve de superar para ser ouvido por seus pares. No início de sua carreira, ele não sabia escrever bem em alemão, a língua preferida pelos principais anatomistas do final do século XIX. Sem pensar duas vezes, Cajal decidiu fundar um periódico científico, a Revista Trimestral de Histologia Normal y Patológica, na qual podia divulgar seus achados fenomenais em sua língua pátria.
Em 1896, ele repetiu a experiência e criou o primeiro periódico científico especializado em neurociência, a Revista Trimestral Micrográfica. Como não poderia deixar de ser, o primeiro fascículo da publicação continha seis manuscritos de autoria de dom Santiago. Anos mais tarde, vários anatomistas alemães não tiveram outra opção senão dedicar-se ao estudo da língua espanhola como única forma de permanecerem atualizados com a fronteira da neurociência representada agora pelos artigos de Ramón y Cajal.
Até hoje, Cajal é um dos mais citados autores na literatura neurocientífica. Sua engenhosidade e resiliência como experimentalista foram reconhecidas inicialmente quando ele adaptou uma nova coloração histológica, La reazione nera (Metodo de Golgi), para seus estudos destinados a elucidar a organização anatômica do tecido nervoso”.