Evolução das formas de organização da pós-graduação brasileira (1996)

Atualizado há 4 anos


Franz Semmelmann, Presidente da Camara de Pós-Graduação, UFRGS
Margot Guerra Sommer, Vice-presidente da Camara de Pós-Graduação; UFRGS
José Palazzo Moreira de Oliveira – CPG Ciência da Computação
João Alifantis – APG

Introdução

A reorganização da pós-graduação no País, em nossa visão, deve-se basear nos seguintes elementos e condicionantes:

  • a constante adequação do sistema de formação de recursos humanos pós-graduados no Brasil constitui-se em prioridade para aperfeiçoar a inserção das instituições brasileiras no contexto mundial estimulando uma cooperação mais estreita destas instituições com as congêneres de outros países;
  • as diferentes medidas governamentais em implantação na área da educação devem ser avaliadas quanto a seu efeito integrador em todos os níveis de ensino;
  • a organização da pós-graduação, neste processo, é entendida como elemento potencializador da aceleração e capacitação do sistema de formação de recursos humanos nas diferentes áreas e níveis de conhecimento;
  • caracteriza-se a necessidade do critério de criação de novos conhecimentos sob forma de pesquisa científica, artística ou tecnológica como a base da pós-graduação. É essencial caracterizar que a pós-graduação não deve ser entendida como elemento complementar atuando como prestadora de serviços especializados;
  • a efetiva participação de instituições do setor não acadêmico, com demanda de recursos humanos qualificados através da pós-graduação depende do estímulo proposto através de política nacional de desenvolvimento. Este estímulo pode ser materializado via políticas fiscais, e de incentivo à formação de recursos humanos entre outras;
  • com relação à qualificação docente, através da pós-graduação, necessitam ser estabelecidos, pelas IES, delimitação de responsabilidades e tarefas associadas a cada nível do plano de carreira, critérios com relação às políticas de admissão através de concursos e incentivos quanto à remuneração.

Flexibilização x autonomia

São considerados fatores essenciais para permitir a evolução da pós-graduação no País, iniciativas que proporcionem a flexibilização dos programas e níveis, relacionadas a uma maior autonomia Institucional.

Na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, a regulamentação da pós-graduação, foi implementada a partir da Resolução 6/94 do COCEP, com vistas à modernização e flexibilização do sistema. Esta Regulamentação veio normatizar os seguintes procedimentos:

  • desvinculação do mestrado como Pré-requisito para doutorado (Art. 2);
  • apresentação de trabalho de pesquisa conclusivo como alternativa à dissertação de mestrado (Art. 4);
  • dispensa do Título de Doutor para orientação, para docentes com alta qualificação (art. 13, Parágrafo 1);
  • atribuição de créditos por atividade compatível com as características da área, além daqueles obtidos por disciplinas (Art. 20);
  • possibilidade de computar todos os créditos de mestrado para o doutorado (Art. 22);
  • alteração de inscrição de mestrado para doutorado com aproveitamento de créditos (Art. 22, Parágrafo Único);
  • estabelecimento de prazos mínimos de (1) ano para mestrado e (2) anos para doutorado (Art. 23);
  • concessão de título de doutor diretamente por defesa de tese (Art. 25).

Esta Resolução foi importante para a implementação de procedimentos normativos, por parte das Comissões Coordenadoras, contribuindo decisivamente para a qualificação acadêmica do Pós-graduação na UFRGS. Tal qualificação pode ser reconhecida a partir da última avaliação efetuada pela CAPES, quando a UFRGS se destacou com relação ao número de mestrados e doutorados com conceitos A e B.

Se a flexibilização associada à autonomia tem sido benéfica à evolução da pós-graduação na UFRGS, o papel da Câmara de Pós-graduação como órgão de controle tem sido por outro lado, decisivo na manutenção dos patamares de qualidade. Com base na experiência da UFRGS, fica claro que a proposição de “flexibilização x autonomia” é valida e importante no processo de evolução do sistema, mas que a atuação eficiente de órgãos de acompanhamento se faz necessária para a manutenção da qualidade.

É importante ressaltar a profunda relação que deve existir entre os programas de pós-graduação e a pesquisa institucional. Estes programas, para que sejam mais eficientes, devem qualificar-se pela integração efetiva com Projetos Estratégicos estabelecidos dentro do plano de ação da(s) unidade(s) envolvida(s).

Programa de cooperação interinstitucional

Os programas de cooperação interinstitucional constituem-se em experiências salutares para a complementação de competências, para permitir a “alavancagem” de grupos de emergentes de pesquisa e para permitir a formação emergencial de professores para cursos de graduação.

Complementação de competências

Neste caso devem ser considerados os aspectos de localização geográfica das Instituições participantes de forma a permitir a mobilidade de alunos e professores. Este tipo de cooperação deveria ser considerada para grupos com avaliações A e B de forma que a qualidade do projeto seja assegurada pela competência já adquirida pelos grupos participantes.

“Alavancagem” de grupos emergentes

De acordo com a portaria 228 do MEC de 15 de março de 1996 são necessários cuidados específicos para que estes programas apresentem boa qualidade. A avaliação realizada pela CAPES nestes projetos é essencial para manter a qualidade do sistema de pós-graduação no país.

Considerando que os grupos emergentes e novas universidades estão procurando, por estes convênios, acelerar seus projetos de qualificação devem ser criados critérios claros e transparentes para que as Instituições interessadas possam se orientar no planejamento destas atividades. O Subprograma de Mestrado Interinstitucional da CAPES pode ser tomado como ponto de partida para esta regulamentação.

Como objetivo principal de programas de cooperação interinstitucional deve estar claramente especificado o comprometimento da instituição emergente em investir na contratação e manutenção de professores devidamente qualificados em seus programas locais. Deve, também, ser exigido um planejamento a médio prazo para a implantação, com recursos humanos próprios ou com participação externa não dominante, de programa de pós-graduação no mesmo nível do oferecido dentro do convênio. Caso exista este planejamento a restrição contida no Subprograma de Mestrado Interinstitucional da CAPES de uma única oferta pode ser reconsiderada dependendo do planejamento global apresentado. Deve-se, entretanto, salientar que não é bom que um grupo emergente forme todos, ou grande parte, de seus docentes em um mesmo grupo de PG o que seria estimulado pela oferta seguida de programas interinstitucionais.

Por outro lado é importante que a grupo consolidado receba incentivos e os recursos necessários para o desenvolvimento das atividades interinstitucionais evitando-se, assim, uma transferência unilateral de recursos.

Formação emergencial de professores

No caso de IES novas e em expansão pode ser necessária a formação local de professores com nível de mestrado. Muitas vezes é impossível, em um curto prazo, o envio destes professores para outras localidades com o objetivo da obtenção do título de mestrado. Nestes casos o Subprograma de Mestrado Interinstitucional da CAPES constitui-se em elemento fundamental. Para este objetivo a limitação à uma única oferta, tal como estipulado no Edital, parece-nos correta.

Educação à distância e pós-graduação (tele-ensino)

Considera-se educação à distância qualquer forma de execução de atividades de ensino sem que haja a proximidade física e a comunicação entre o professor e os alunos seja realizada por meio de algum artefato intermediário tais como: cartas, textos impressos, televisão, telefonia ou ambientes computacionais.

Esta possibilidade de ensino constitui-se em elemento fundamental para aumentar o fator multiplicador dos escassos recursos de alto nível disponíveis no país. Constitui-se, também, em uma continuação e complementação do programa Tele-Escola desenvolvido pelo MEC a nível do ensino do primeiro ciclo. É imprescindível a integração de todos os recursos disponíveis para desconcentrar a formação pós-graduada que, atualmente, está essencialmente instalada na região de São Paulo e Rio de Janeiro.

É importante que estas atividades tenham um critério de avaliação equivalente ao do ensino com presença física.

Caracterização de áreas

Para que seja possível a utilização de técnicas de educação a distância é necessário que a área de conhecimento possua algumas características específicas. Entre estas características podem ser citadas:

  • Ser uma área onde o essencial do conhecimento possa ser trabalhado sem a necessidade de ambientes físicos específicos tais como laboratórios, teatros, dispositivos materiais (barras paralelas, piscinas, prensas hidráulicas etc.).
  • Permitir o desenvolvimento de competências de forma autônoma mas sob acompanhamento do professor; como exemplo podem ser citados trabalhos de tradução, especificação e desenvolvimento de programas de computador, resolução de equações diferenciais, estudo e análise comparativa de legislação etc. Esta característica dificulta o ensino de técnicas que requeiram o acompanhamento ou mesmo a intervenção direta do professor.
  • Existir suficiente material de consulta bibliográfica acessível remotamente tal como ocorre em medicina, computação, direito entre outras áreas.

Considerações sobre atividades remotas

As atividades remotas que caracterizam a educação à distância devem estar integradas em um programa compreensivo de pós-graduação e devem ser submetidas ao mesmo processo de avaliação da qualidade de outras formas de ensino. Alguns tópicos que merecem análise mais detalhada:

  • Acompanhamento das atividades dos alunos e avaliação individual do trabalho desenvolvido.
  • Preparação de material instrucional adequado, flexível e de boa qualidade. É necessária a avaliação entre os alunos e o professor e entre os alunos. Muitas vezes o ensino à distância tem sido confundido com “ensino programado” que reduz-se a um mero treinamento em um tópico específico sem permitir o desenvolvimento da atividade crítica e de pesquisa individual do aluno.
  • Desenvolvimento de atividades complementares antecedendo e seguindo a fase de ensino remoto de forma a complementar o material instrucional para uso remoto. Estas atividades podem ser: pesquisas de campo, pesquisa bibliográfica, entrevistas, redação de monografias etc.
  • Limitação do número de tele-alunos por professor para assegurar a qualidade do acompanhamento.
  • Registro detalhado das interações entre alunos e professor para permitir uma avaliação de crescimento individual e uma avaliação crítica dos procedimentos de ensino.
    Interdisciplinariedade

A interdisciplinaridade de programas de pós-graduação deve ser considerada entre programas com avaliações A e B de forma que a qualidade do projeto seja assegurada pela competência já adquirida pelos grupos participantes. Neste caso devem ser considerados os aspectos de atualidade e da natureza complementar das áreas de pesquisa. A localização geográfica das instituições participantes deve ser suficiente próxima para permitir a interação adequada de alunos e professores, alternativamente podem ser propostos outros meios de coordenação e comunicação.

A CAPES deve propor um mecanismo adequado de avaliação para estes cursos. Como início de discussão pode ser proposta uma análise por consultores ad hoc de cada uma das áreas envolvidas no programa para assegurar o mérito científico em cada uma das áreas bem como da área nova do conhecimento. Este mérito deve ser assegurado por pesquisas já desenvolvidas, ou em desenvolvimento, que indiquem a viabilidade da proposta.

Pós-graduação lato-sensu

A Câmara de pós-graduação, diante da necessidade de normatização do pós-graduação lato-sensu, já elaborou minuta de Resolução que deverá ser implementada pelo CEP, com vistas aos Cursos de Especialização no âmbito da UFRGS.

Esta regulamentação, todavia, se faz necessária, a nível nacional face a diferentes fatores, quais sejam:

  • aumento expressivo da demanda no último quinquênio, decorrente de exigências de qualificação docente em IES, como também da necessidade de aperfeiçoamento de profissionais provenientes do setor empresarial;
  • ausência de controle com relação à qualidade dos cursos;
  • ausência de uma Política Nacional quanto à especialização, a qual atualmente é apenas tratada nas Resoluções 12/83 CFE e 02/96 CNE, voltadas diretamente à regulamentação da especialização para docentes de IES;
  • necessidade de atualização de critérios para o credenciamento destes cursos.

A regulamentação a ser elaborada a nível nacional deve ser abrangente, levando em consideração os perfis de cursos de especialização atualmente oferecidos, e que se distribuem em uma tipologia básica que pode assim ser caracterizada:

  • cursos de especialização voltados à interação com o setor empresarial, para atender a demandas tecnológicas específicas;
  • cursos de especialização voltados à níveis iniciais da pós-graduação, dirigidos à formação acadêmica.

Considera-se muito importante que os programas de especialização, principalmente aqueles oferecidos “fora da sede” devam promover cursos integrados com projetos de pesquisa dentro dos planos de ação da instituição receptora, estabelecendo-se desta forma a nucleação de um sistema de pós-graduação organizado.

Para que a Universidade possa atender, por outro lado, com mais eficiência o leque das demandas sociais sugere-se que sejam implementadas estratégias especiais de fomento visando a qualificação de docentes que atuam em cursos de licenciatura. Os programas Pró-Ciência, implementado por algumas agências regionais de fomento – FAPs, com recursos do MEC, deveriam oferecer, além dos cursos de treinamento para professores de ensino médio, programas de especialização para docentes que atuam diretamente em cursos de licenciatura. Desta forma a transferência qualitativa atingiria, mais rapidamente, o futuro docente que irá atuar, a curto prazo, no ensino médio.

Mestrado dirigido à formação profissional

A partir da Regulamentação estabelecida na Resolução 6/94 todos os cursos de pós-graduação da UFRGS, potencialmente, estão habilitados a oferecer mestrado voltado ao setor empresarial. Por outro lado a Resolução 01/95 CAPES, que estabelece os “Mestrados Dirigidos à Formação Profissional” compartimenta o mestrado indo de encontro à proposta de flexibilização.

Considera-se que a formação de mestres e doutores para o setor empresarial deve ser estabelecida como decorrência da vocação de determinados cursos, expressa em seus regimentos internos, e deve ser estabelecida dentro do sistema de apoio atualmente oferecido pela CAPES, CNPq e FAPs. O financiamento de atividades de pesquisa, em todo o mundo, é essencialmente suportado pelo Estado. Esta afirmação é evidenciada pelo artigo “Careers ’95: The Future of the Ph.D.”: Science,6 Oct.1995.(figura a seguir)

(Acessos 200)